Nos últimos dias, manchetes chamativas e publicações alarmistas têm se espalhado pelas redes e pela imprensa: “Zema autoriza aumento de mais de 200% em taxas cartoriais” ou “Zema sobe taxas para registro de imóveis em 500%”. Mas será que é bem assim? Em meio a um cenário de desinformação, tentativas de exploração política e um ano eleitoral em curso, o Portal Descubra investigou a fundo o caso.
A origem de toda a polêmica está na Lei Estadual nº 25.125, de 30 de dezembro de 2024, aprovada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) com apoio de 54 dos 77 deputados, a partir de um projeto encaminhado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). A lei alterou profundamente a forma de cobrança dos emolumentos nos cartórios do estado. A medida foi sancionada pelo governador Romeu Zema (Novo) sem vetos.
A nova legislação teve sua regulamentação detalhada na Portaria nº 8.366/CGJ/2025, publicada em 5 de janeiro deste ano pela Corregedoria-Geral de Justiça, com vigência a partir de abril. Entre outras mudanças, ela criou uma sobretaxa progressiva apenas para imóveis cujo valor ultrapasse R$ 3,2 milhões, faixa que representa menos de 1% das transações imobiliárias em cidades como Belo Horizonte, segundo a Anoreg-MG.
A cada R$ 500 mil adicionais, será acrescida uma cobrança de R$ 3 mil, até o limite de 300 vezes o valor da taxa básica. Ou seja, para um imóvel de R$ 4,2 milhões, o custo do registro pode aumentar em até R$ 6 mil. O objetivo declarado da medida é aplicar uma tributação mais elevada sobre operações de altíssimo valor, respeitando o princípio da capacidade contributiva.
Segundo o TJMG, parte da arrecadação com a nova tabela será direcionada a órgãos como o Ministério Público de MG, Defensoria Pública e Advocacia-Geral do Estado.
A medida, no entanto, passou a ser questionada judicialmente. O Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG) ingressou com um Procedimento de Controle Administrativo no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), sob o número 0003601-67.2025.2.00.0000, alegando que a portaria que trouxe a nova tabela não respeitou o princípio da anterioridade, previsto na Lei Federal nº 10.169/2000. Segundo o sindicato, a primeira tabela, publicada em dezembro de 2024, não previa a sobretaxa — esta apareceu somente em março de 2025.
Em resposta, o CNJ determinou que o TJMG se manifeste em até 5 dias úteis. O processo segue concluso para decisão.
O relator do projeto na ALMG foi o deputado Roberto Andrade (PRD), que já presidiu a Anoreg-MG, associação que representa os cartórios. O projeto original apenas tratava da gestão de recursos de atos gratuitos, mas após o primeiro turno de votação, a Comissão de Administração Pública incluiu as tabelas de cobrança atualizadas e a sobretaxa para imóveis de alto valor.
Confira a lista dos deputados que votaram a favor do projeto:
Deputados que votaram a favor (54):
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Adriano Alvarenga (PP)
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Alencar da Silveira Jr. (PDT)
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Ana Paula Siqueira (REDE)
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Andréia de Jesus (PT)
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Antonio Carlos Arantes (PL)
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Arnaldo Silva (UNIÃO)
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Beatriz Cerqueira (PT)
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Bella Gonçalves (PSOL)
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Betão (PT)
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Betinho Pinto Coelho (PV)
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Bim da Ambulância (AVANTE)
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Bosco (CIDADANIA)
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Carlos Henrique (REPUBLICANOS)
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Cassio Soares (PSD)
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Celinho Sintrocel (PCdoB)
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Charles Santos (REPUBLICANOS)
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Chiara Biondini (PP)
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Coronel Henrique (PL)
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Cristiano Silveira (PT)
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Delegada Sheila (PL)
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Delegado Christiano Xavier (PSD)
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Douglas Melo (PSD)
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Dr. Maurício (NOVO)
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Duarte Bechir (PSD)
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Enes Cândido (REPUBLICANOS)
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Gil Pereira (PSD)
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Grego da Fundação (PMN)
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Gustavo Santana (PL)
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Ione Pinheiro (UNIÃO)
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João Junior (PMN)
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João Magalhães (MDB)
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João Vítor Xavier (CIDADANIA)
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Leandro Genaro (PSD)
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Leleco Pimentel (PT)
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Leninha (PT)
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Lohanna (PV)
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Lucas Lasmar (REDE)
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Lud Falcão (PODE)
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Maria Clara Marra (PSDB)
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Marli Ribeiro (PL)
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Marquinho Lemos (PT)
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Nayara Rocha (PP)
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Noraldino Júnior (PSB)
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Professor Wendel Mesquita (SOLIDARIEDADE)
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Rafael Martins (PSD)
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Ricardo Campos (PT)
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Roberto Andrade (PRD)
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Rodrigo Lopes (UNIÃO)
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Thiago Cota (PDT)
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Tito Torres (PSD)
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Ulysses Gomes (PT)
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Vitório Júnior (PP)
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Zé Guilherme (PP)
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Zé Laviola (NOVO)
Deputados que votaram contra (5):
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Doutor Jean Freire (PT)
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Eduardo Azevedo (PL)
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Elismar Prado (PSD)
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Leonídio Bouças (PSDB)
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Sargento Rodrigues (PL)
(Nota: lista oficial da ALMG com base em registros de votação do segundo turno, disponíveis no site institucional.)
A Anoreg-MG emitiu nota rebatendo o conteúdo veiculado por grandes portais. Segundo a entidade, os reajustes foram de 4,76% para a maioria dos atos cartoriais, índice que acompanha a inflação, sendo a sobretaxa aplicada apenas aos imóveis de altíssimo valor.
Faixa de valor do imóvel | Reajuste de 2025 |
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Até R$ 3,2 milhões | 4,75% |
Acima de R$ 3,2 mi | + R$ 3 mil a cada R$ 500 mil excedentes |
Limite máximo | 300 vezes a taxa básica (R$ 900 mil) |
Taxas incluídas obrigatoriamente |
Emolumentos cartorários |
TFJ (Taxa de Fiscalização Judiciária) |
Repasses para MPMG, DPMG, AGE e Fundo RECOMPE |
O Portal Descubra entrou em contato com o CNJ, que confirmou que o caso está sob análise regular. Também buscamos o Governo de Minas, mas não obtivemos resposta até o fechamento desta matéria.
O Sinduscon-MG, por meio de nota, informou que “aguarda a avaliação do caso em discussão no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e que não comenta casos em tramitação junto aos órgãos judiciários. Tão logo haja uma decisão, será possível contribuir com mais informações para assegurar a sustentabilidade econômica e impulsionar o mercado imobiliário do estado”.
Diante da polarização do debate, da circulação de informações truncadas e de interesses em jogo, especialmente num ano eleitoral, o Portal Descubra reafirma seu compromisso com o jornalismo sério e investigativo. Desde a primeira publicação sobre o caso, seguimos apurando com base em documentos oficiais, ouvindo todas as partes envolvidas e alertando para possíveis distorções.
Diante de tantas versões conflitantes e interesses em jogo, fica o alerta: é fundamental buscar fontes confiáveis antes de tirar conclusões precipitadas. Especialmente em ano eleitoral, informações distorcidas podem confundir e manipular a opinião pública. Siga acompanhando com o Portal Descubra para entender o que realmente está por trás dessa discussão sobre as taxas cartoriais em Minas.