O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirou nesta quarta-feira (18) o sigilo do relatório da Polícia Federal (PF) que apura um suposto esquema de espionagem ilegal operado dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O documento, que possui mais de 1.200 páginas, traz detalhes da atuação de uma estrutura clandestina, conhecida como “Abin Paralela”, que teria sido utilizada para monitorar ilegalmente autoridades dos Três Poderes, jornalistas, servidores públicos, opositores políticos e até aliados do governo anterior.
De acordo com o relatório, a espionagem foi realizada por meio da utilização irregular do sistema FirstMile, uma ferramenta de geolocalização capaz de rastrear a localização de celulares em tempo real, sem necessidade de autorização judicial. A prática, segundo a PF, teve motivação política, eleitoral e pessoal, com o objetivo de proteger aliados, atacar adversários e fortalecer Jair Bolsonaro no poder.
Autoridades monitoradas
A lista de pessoas monitoradas ilegalmente inclui ministros do STF, parlamentares, ex-autoridades, servidores públicos, jornalistas e outros nomes considerados críticos ao governo da época. Entre os principais alvos estavam:
-
Alexandre de Moraes, ministro do STF;
-
Luís Roberto Barroso, presidente do STF;
-
Luiz Fux, ministro do STF;
-
Dias Toffoli, ministro do STF;
-
Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados;
-
João Doria, ex-governador de São Paulo;
-
Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara;
-
Jean Wyllys, ex-deputado federal;
-
Servidores do Ibama, como Hugo Loss, que atuou em operações contra o garimpo ilegal na Amazônia;
-
Carlos Alberto Litti Dahmer, representante de caminhoneiros críticos ao governo;
-
Funcionários do STF, inclusive da área de tecnologia;
-
Jornalistas e comunicadores considerados opositores ou críticos.
Espionagem também visava eleições
O inquérito da PF identificou que o sistema de espionagem clandestina apresentou picos de utilização durante as eleições municipais de 2020, sugerindo uma possível tentativa de interferência no processo eleitoral.
Outro método identificado foi o chamado “cercamento”, que consistia em traçar áreas geográficas de interesse — como prédios públicos — para detectar a presença de pessoas monitoradas, como ocorreu nas proximidades do Tribunal de Justiça do Distrito Federal.
Indiciamentos e próximos passos
O relatório resultou no indiciamento de 36 pessoas, incluindo:
-
O vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ);
-
O ex-diretor-geral da Abin e atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ);
-
Membros da cúpula da Abin, inclusive da atual gestão.
Apesar de não ter sido formalmente indiciado nesse inquérito específico, Jair Bolsonaro foi apontado pela PF como “principal beneficiário” do esquema criminoso. Segundo os investigadores, ele tinha conhecimento do funcionamento da estrutura clandestina, não atuou para interrompê-la e dela se beneficiou politicamente.
Agora, com o inquérito concluído e o sigilo levantado, o relatório foi encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR), que irá analisar os elementos apresentados e decidir se oferece denúncia formal contra os envolvidos.
O que dizem os citados
Até o momento, nem a defesa dos indiciados nem a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) se pronunciaram oficialmente sobre a decisão. A Abin informou apenas que não vai se manifestar sobre o caso.