A Polícia Federal (PF) concluiu que o ex-presidente Jair Bolsonaro e seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro, integravam o núcleo estratégico da organização criminosa que operava clandestinamente dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo anterior.
O relatório, entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), afirma que Bolsonaro e Carlos eram os principais beneficiários políticos das ações ilegais promovidas pela chamada “Abin Paralela”. De acordo com a PF, eles definiram alvos de espionagem, entre opositores, autoridades públicas, ministros do STF e até jornalistas.
O documento aponta que o grupo era formado por “figuras de alto escalão do governo à época”, com o ex-presidente e seu filho no centro das decisões. Segundo os investigadores, a organização criminosa tinha como objetivos proteger membros da família presidencial, atacar adversários políticos e disseminar campanhas de desinformação, especialmente contra o sistema eleitoral.
Uso indevido de ferramentas de espionagem
A apuração revelou que a Abin foi instrumentalizada para fins pessoais e políticos, utilizando ilegalmente recursos humanos, financeiros e tecnológicos. A agência operou, por exemplo, com o sistema israelense de geolocalização FirstMile, que permitia rastrear até 10 mil celulares por ano, de forma clandestina, entre 2019 e 2021.
Entre os alvos monitorados ilegalmente estavam ministros do STF, deputados, jornalistas e autoridades públicas. Em um episódio curioso, agentes chegaram a monitorar um homônimo do ministro Alexandre de Moraes, acreditando ser o próprio magistrado.
Tentativa de golpe e blindagem familiar
O relatório também associa a atuação da Abin Paralela aos desdobramentos da tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023. Segundo a PF, o núcleo operava para sustentar um “estratagema de vigilância ilegal, disseminação de desinformação e blindagem dos integrantes do núcleo político”, que culminou nos atos golpistas daquele dia.
Outro episódio destacado na investigação é uma gravação de reunião ocorrida em 2020, na qual Bolsonaro, o então diretor da Abin, Alexandre Ramagem, e advogadas de Flávio Bolsonaro discutem estratégias para monitorar auditores da Receita Federal, responsáveis por investigações no caso das “rachadinhas”.
Indiciamentos e desdobramentos
No total, 36 pessoas foram indiciadas, incluindo Carlos Bolsonaro, Alexandre Ramagem — ex-diretor da Abin e atual deputado federal — e integrantes da atual cúpula da agência. Parte deles também responde por tentativa de obstrução da Justiça, após tentarem esconder equipamentos e documentos durante as investigações.
Apesar de apontado como líder da organização criminosa, Jair Bolsonaro não foi formalmente indiciado neste inquérito, pois já é réu no STF por organização criminosa no processo relacionado à tentativa de golpe, o que, segundo a PF, impede uma nova acusação pelo mesmo crime, pelo princípio da vedação à dupla incriminação.
Posicionamentos
Até o momento, nem Bolsonaro nem Carlos se manifestaram oficialmente. Em uma rede social, Carlos ironizou o indiciamento, sugerindo que seria perseguição política. A Agência Brasileira de Inteligência informou, em nota, que não irá se manifestar sobre o caso.
As investigações continuam e devem gerar novos desdobramentos judiciais nas próximas semanas.